O MP-BA recebeu formalmente a denúncia contra a obra já embargada pela prefeitura e o Ibama fiscalizou o local
Embargada pela prefeitura de Ilhéus por falta de licença e documentação necessária, a obra irregular no Aeroporto Jorge Amado para implantação de um posto de abastecimento de aeronaves chamou a atenção de outros órgãos e se tornou alvo de fiscalização.
Obra embargada
O Ministério Público da Bahia (MP-BA) recebeu denúncia formal sobre as irregularidades, principalmente sobre a acusação de crime ambiental em área de preservação permanente com características de ecossistema de manguezal.
No último dia 22 de agosto, a promotora Aline Valéria Archangelo encaminhou o caso à 11ª Promotoria de Justiça para averiguação.
"Considerando que o risco de dano se refere a área inserida em meio urbano, determino sejam os autos remetidos à 11ª PJ, a fim de que avalie e adote as medidas que entender cabíveis".
Procurado pela reportagem na época da denúncia, em agosto, o MP-BA informou iniciallmente que "a competência para atuação em infrações administrativas ou crimes que versa sobre meio ambiente dentro da área do aeroporto, compete ao MPF, visto ser área federal".
O órgão foi novamente consultado pelo BNews, mas ainda não se manifestou sobre o andamento da denúncia formalmente apresentada.
Já o Ministério Público Federal (MPF-BA) foi procurado pela reportagem na época da denúncia e também nesta segunda-feira (15), mas não respondeu em nenhuma das ocasiões.
Fiscalização do Ibama
O caso também chamou a atenção do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). A reportagem recebeu imagens que mostram membros do órgão, devidamente fardados, realizando uma fiscalização na área que motivou a denúncia.
O BNews também entrou em contato com o Ibama em busca de informações sobre os resultados da fiscalização, que informou ter encaminhado a demanda para "unidade de verificação".
Procurado, o superintendente Bruno Martinez informou que a equipe não identificou indícios de intervenção para uma possível autuação.
"A equipe de fiscalização do Ibama foi no local verificar a ocorrência de dano ambiental, mas não houve autuação porque não tinha nenhuma intervenção de obra no local que justificasse. Foi prestada a devida orientação para buscar os órgãos competentes para o regular licenciamento".
Área de preservação ambiental permanente
Em um laudo que a reportagem do BNews teve acesso,, com parecer técnico do biólogo Alfredo Barbosa Gusmão, são listados traços de que o local da obra se trata de Área de Preservação Permanente (APP), por exemplo:
- proximidade ao Rio Cachoeira pertencente à Bacia Hidrográfica Rio Cachoeira
- indícios de solo hidromórfico
- canal de drenagem que caracteriza conexão hidrológica potencial e influência de marés
- presença de água a apenas 30 centímetros de profundidade, o que indicaria saturação do solo
- risco à vegetação nativa (restinga e manguezal)
- proximidade de curso d'água natural
- anexo
O relatório, que deverá ser apresentado à prefeitura de Ilhéus e aos órgãos responsáveis, descreve como fundamentação legal:
- Constituição Federal, art. 225 – Direito ao meio ambiente equilibrado e dever de preservá-lo.
- Lei Federal nº 12.651/2012 (Código Florestal) – Art. 4º, incisos I e IV: APP de 500 metros de margem para rios com largura superior a 600 m.
- Resolução CONAMA nº 303/2002 – Art. 3º, X: Define o manguezal como APP “em toda a sua extensão” e estabelece APP mínima de 100 m no entorno de estuários.
- Resolução CONAMA nº 429/2011 – Critérios para caracterização e restauração de APPs em áreas úmidas.
- Lei nº 9.605/1998 (Crimes Ambientais) – Art. 38 e 38-A: proíbem a destruição de vegetação em APP
- anexo
Além disso, o documento indica a necessidade de embargo da obra e de vistoria técnica, que incluiria medição do lençol freático por meio de piezômetro, avaliação da conexão hidrológica com o mangue e o estuário, verificação da regularidade da obra, emissão de um relatório ambiental inicial (greenfield) na fase de Licença Prévia (LP), registrando a linha de base ambiental e identificando eventuais passivos e perícia sobre fauna e flora da área.
Vídeos enviados à reportagem reforçam a denúncia da existência de água no solo com baixa profundidade e do curso d’água natural nas proximidades da obra, assim como uma medição para comprovar que o local está situado dentro de 500 metros da margem assegurados pela Lei nº 12.651/2012 (Código Florestal), art. 4º, incisos I e V para canais com largura superior a 600 metros.
O que dizem os vereadores da cidade?
Diante da discussão, a reportagem do BNews apurou como está sendo tratada a questão dentro da Câmara Municipal de Vereadores.
Procurada, a vereadora Enilda Mendonça (PT) afirmou que tem acompanhado as medidas tomadas pela gestão municipal. "Até o momento agiram certo", declarou ao destacar que ainda não nenhum debate sobre a obra na Câmara.
Já o vereador Maurício Galvão (PSB), que é engenheiro florestal, disse ter tomado conhecimento de que a área da construção não seria de manguezal, e sim próxima, mas que buscaria mais informações através de fiscalização no local. Portanto, não apresentou retorno sobre o caso.
O que diz a prefeitura?
Procurada pela reportagem do BNews, a prefeitura de Ilhéus confirmou se tratar de uma obra dentro da área do Aeroporto Jorge Amado para implantação de um posto de combustível aéreo da empresa Avigás, mas ressaltou que a continuidade depende dos licenciamentos devidos junto à Secretaria de Meio Ambiente e outros órgãos responsáveis.
Em nota, a gestão municipal também confirmou ter feito o embargo da obra, por meio da Secretaria de Ordem Pública, devido à irregularidades, e que a liberação só ocorrerá após alinhamento dos procedimentos legais junto à empresa.
“A Prefeitura de Ilhéus, por meio da Secretaria Municipal de Meio Ambiente, informa que a empresa AVGAS Nordeste encontra-se em processo de licenciamento para implantação de um novo empreendimento no bairro Pontal.
Porém, foi verificado o início das obras antes da conclusão das etapas necessárias do processo, o que levou à adoção de medida de embargo pela Secretaria de Ordem Pública, conforme determina a legislação.
A administração municipal reforça que o diálogo com a empresa está em andamento para que todas as ações sejam realizadas dentro dos procedimentos legais vigentes, assegurando o desenvolvimento econômico, a preservação ambiental e o ordenamento urbano”.
O que diz a Socicam?
A Socicam, empresa responsável pela administração do Aeroporto Jorge Amado, também foi procurada pela reportagem, e negou que exista obra em andamento para construção de um posto de abastecimento.
“A concessionária do Aeroporto de Ilhéus informa que, no momento, não há obras em andamento para a construção de um novo Parque de Abastecimento de Aeronaves (PAA) no empreendimento”.
No entanto, a Socicam destaca que há negociação com uma empresa interessada em prestar o serviço no local, mas que qualquer prosseguimento nas tratativas só ocorrerá mediante apresentação de documentação necessária.
“Embora haja tratativas com uma empresa interessada em instalar o posto em área adjacente ao já existente, a autorização para qualquer intervenção está condicionada à apresentação, pela empresa, de todas as licenças exigidas pelos órgãos competentes”.
Por fim, a administradora “reafirma seu compromisso com o cumprimento da legislação vigente e com a excelência das operações no Aeroporto Jorge Amado”.
Avigás Nordeste
A reportagem do BNews não conseguiu contato com a Avigás Nordeste através dos meios disponibilizados junto ao registro da empresa, assim como por meio da Comav Transportes, companhia que atua em parceria com a empresa citada no transporte de combustíveis, e nenhum retorno foi dado até o momento.
Outros órgãos
O BNews procurou também o Instituto Do Meio Ambiente E Recursos Hídricos (Inema), responsável pela gestão ambiental e de recursos hídricos no estado da Bahia, que informou ser "que a responsabilidade seria da Prefeitura local, visando que é a responsável para licenciamento e fiscalização do empreendimento".
Por, BNews